quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Dos desesperos e afagos

Ela o olhou com caras e bocas, remexendo lépida os quadris estreitos, como se houvesse uma cadência submetida às batidinhas suaves da caixa de fósforos, umidecida pelo gelo derretido do copo de cerveja.
Nem bem o som começou, estourou-lhe no corpo a sensação brusca de torpor, ao passo que se envolvia nos braços do homem cujo rosto sustentava uma espécie de ruga embotada - estrias cortantes, dilacerando o gélido, vago e suave constante disparate da sensação delicada de se estar ali, sozinho e zonzo.
Entraram mudos, saíram assanhados, despejaram na sarjeta meia dose de uísque barato, encharcaram o corpo de meio litro de suor amargurado do ano retrasado e caíram na esquina.
Ela, para a direita.
Ele, gauche.

Ivna Alba

sábado, 5 de dezembro de 2009

Da poesia para um amor

Caro rapaz,

Eu te peço um minuto de tua vida para ler estas poucas palavras.
Embora não pareça, eu sou aquela de modos frágeis, embaixo de uma Jericó. E, embaixo do meu travesseiro eu guardo muitos sonhos. Na verdade, eu os escondo, porque eu tenho vergonha.
Envergonho-me de sentir a face ruborizada, de ser feminina, de ser elogiada - muito embora eu goste, como toda boa moça, de ouvir elogios.
Não! Eu não tenho prospecções de formar uma família feliz, porém eu tenho desejo de construir minha vida junto a alguém, apesar de não saber se isso será possível.
Na maior parte do tempo, caro rapaz, eu sou apressada, ansiosa, dispersa, mas eu tenho muito apreço, amor e gentileza para dar, assim como desejo receber em troca.
Como eu não sou nenhum Mello Neto, para construir poesias, desfaço dos versos para criar o inverso: a prosa contínua de um moto contínuo, de um enlace que desenlace a face da minha pessoa em amor e lírica.

Ivna Alba

Esboço para a passagem do tempo

O tempo havia descrito uma parábola completa de seis meses e dezenove dias completos e ininterruptos.
Catarine levantara cedo, como todas as manhãs daquele prazo, e sentiu-se neutra. Os braços apoiados na grande janela do apartamento, as mechas louras escorrendo pelos ombros, o raio do primeiro sol desenhando-lhe o perfil na parede branca, o olhar cansado e sonolento, o frio interrompendo a respiração morna. Olhou o travesseiro e pensou em refugiar os pensamentos de modorra nele, mas nada lhe impelia a tal consequência.
Em pouco tempo a moça havia amadurecido substancialmente, e partiu do que se poderia chamar, de um estrondo de alegrias fugazes, para o cerne das decisões sensatas. Perfurou as barreiras, desenlaçou o futuro com as próprias mãos, atingiu as dezenas de soldados do batalhão das adversidades e abriu as trincheiras do campo inimigo da vida sozinha, sem o auxílio de nada, nem ninguém.
O que fazer agora? Seguir adiante - e sozinha, mais uma vez - o caminho que projetara para seus dias.
Ela perdera os contatos primordiais, tão bem como os fez. Quando o telefone chama e não se obtem resposta, dificilmente se tentará novamente. Assim acontecera, de forma sucessiva, paulatina e, após um tempo, frequente.
O sol se fazia em círculo, deixara o aspecto radial.
Um bilhete. Um nexo. Uma foto. Catarine nunca saíra bem nas fotos, gostava de tirá-las, contudo na maioria das vezes elas tremulavam; como o peixe que balançava a água calma do aquário de pedregulhos coloridos.
- Alfinete, hora do desayuno.
Uma hora ela se divertia no espanhol, outra no inglês, outra no alemão, outra no francês, mas preferia o bom e velho italiano.
Na mesa, uma porção de papéis espalhados, rabiscados e no chão da sala a carta que relera na noite anterior. A carta do pai:
- Catarine, um dia você vai se sentir só. Extremamente só. Mas, não se perturbe por isso, assim como eu fiz a escolha de um eremita, o tempo lhe dará a oportunidade de se achar nas caricaturas e sátiras dos segundos desvalidos. Assim como eu, você terá duas escolhas: seu esboço e sua obra-prima. Cabe a você saber fazer a hora da passagem de uma para outra.

Ivna Alba

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A nostalgia do final de ano

Chegamos, novamente, em dezembro.
Para mim, o melhor mês do ano e por um motivo apenas: a época da renovação das ideias e de si. Cada vez que o insuperável mês derradeiro invade a folhinha do calendário, tento sentir o "cheirinho de natal", de que minhas irmãs tanto falavam, quando éramos pequenas.
Eu lembro de tantas coisas de dezembro: do Natal, quando meu avô era vivo, dos inúmeros presentes, da árvore que minha mãe armava no canto da sala - abaixo do relógio de pêndulo, que eu tanto amo - da emoção (quando cria em Papai Noel) de esperar chegar a manhã do dia 25, e abrir os presentes que o bom velhinho me deixara.
Contudo, não vou mentir que o revéillon só veio ter um sentido mais forte em meus dias, depois que deixei de passá-lo ao lado da minha família. Para mim, os 10 últimos segundos são os mais fortes da vida, é onde tudo acaba e começará, se se começar. Entretanto, é o instante final de tudo que passou, de tudo que morreu, de tudo que se foi, que aconteceu bem ou mal, mas houve. Como podemos ser tão encantados e desencantar o universo de modo tão subliminar?
Apesar de triste, o 12, para mim possui inúmeros significados, tão abrangentes, que prefiro não citá-los no momento, porque além de um instante em que toda a alma me dói, reflito que envelhecerei mais um ano. E se por um acaso nos próximos 365 dias eu não fizer valer a minha vida, de que me adiantarão mais milhões de segundos?
Nesse dezembro eu espero respostas, terei que tomar decisões, precisarei seguir adiante com coisas que, talvez, nem tenha mais forças, e por isso mesmo terei que tê-las.
E sabe? Uma coisa eu adorei neste ano de 2009: foi saber onde cometi erros e, além de admiti-los, ter a consciência de que realmente aprendi com aqueles.
Anteriormente, eu os conhecia, mas sabia que podia passar sem sentir.
E ratifico: como é bom essa nova sensação!

Ivna Alba

domingo, 22 de novembro de 2009

Rapsódia

E na lógica que as cores e suas ausências lhe inventaram os amores, ela fundou sua vida em sonhos de arco-íris.

Ivna Alba

Quando não se pertence mais a nenhum mundo

Olhava pela janela. O mundo lá fora estava da mesma forma que antes, ou seu modo de ver as coisas havia mudado completamente?
Existia algo de muito estranho, uma sensação de aversão e, ao mesmo tempo, de horror. Os que nele se reconheciam, não o faziam mais, e a frieza começara a invadir-lhe o peito, a alma, os segundos e as horas de vida.
Morder o fruto não lhe deixava a boca cheia de saliva, como para digerir os problemas, as lágrimas não lhe vinham, e se acontecia, eram poucas as que escorregavam faceiras de seus olhos.
Mundo, tão diverso, vasto e distinto mundo de coincidências, pequeninices e mudanças repentinas.
Assim, como de forma desapercebida, ele passou por aqui, deixou suas pegadas, que a brisa levou consigo em seu seio transparente e com cheiro de mar.
Inundou-me completa e vivaz.

Ivna Alba

sábado, 7 de novembro de 2009

Indícios do beijo roubado

Como se não bastassem os vinte anos, sem ninguém ao redor, Catarina inventou de recolher em seu baú de músicas e histórias sofridas, dezenas e milhões de timbres em modo menor. Espalhou-os todos no chão de sua sala, com piso de taco envernizado há pouco tempo e precipitou-se em lágrimas e gargalhadas convulsivas, relembrando de cada minuto e segundo auspicioso da vida.
Como se já não coubesse dentro de si, tamanha reconstrução de vida, casa, amigos, família, emprego, mas principalmente, o refazer dela mesma. Tudo foi somado, calculado, refletido e bem pensado.
Não! Catarina nunca faria algo do tipo. Pensado? Mas, naquela tarde de 17 de julho, ela fez. Planejou as páginas em branco de sua mais nova obra, apontou todos os grafites e esferográficas, desembolsou meia dúzia de taças de vinho, acendeu o charuto do pai - cubano legítimo - e pôs tudo para fora: seios, pernas, coxas, ombros, costas, pélvis, pênis, mãos, dedos, pés, joelhos, pescoços, nucas, até chegar à boca. Ao lado desta, um sinal da candura e disfarce de suas intenções.
Ela queria, intensamente! Mas, onde havia tal coragem para pegar-lhe o tesouro escondido no recanto daqueles lábios pequenos e finos?
Afastou-se andando taciturna, enquanto a Nara dizia sussurrando levemente:
- Eu amei. E amei, ai de mim, muito mais, do que devia amar!

Ivna Alba

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

E então, meu amigo...

Então, quando as coisas apertam, eu sento e choro um pouquinho.
E o mundo não parece tão grande, nem tão pequeno...
A lágrima derreterá antes que eu me vá, deixando um lastro de rigidez e frialdade em meu peito.
Assim como o barco que vai e volta, penso que tudo não passa de maré.

Ivna Alba

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

As coisas do mundo, como são...

E cá estou eu, em meio à sala/cozinha gelada da minha casa, com o note aceso, minha caneca, lápis e bloco da pinacoteca, enquanto penso em como as coisas se romperam e os meus sonhos saltaram em meu colo, repentinamente, com a selvageria de um leão corrompido pela fome instintiva.
Há três meses atrás e quatorze dias atrás eu me achava sorumbática, em algum lugar distante dessa cidade ensandecida, e pensava: "Quando será o momento?"
Como sou dada às viagens sem explicações, bem como decisões bruscas e imediatas, aqui estou eu. Por mais que as adversidades sejam gigantescas, decidi-me a não discar o número das mesmas, muito menos dar-lhes a menor importância. Se eu o fizer, para que vim parar aqui?
A frase de ordem, desde minha partida e chegada tem sido: Seguir em frente, não importa o que se vá enfrentar. E, talvez por isso mesmo, não tenha sentido os efeitos vorazes da realidade.
Claro que eu sei tudo o que está se passando a minha volta, obviamente reconheço os tortuosos despenhadeiros que pulo ou galgo, todo santo dia, contudo prefiro sorrir a cada derrapada, entretanto desejo gargalhar da fome, do frio, do medo, da discriminação, do preconceito, da falsidade e das caras feias, que posam para minha pessoa, assim que viro as costas.
Entre um espinho e uma rocha, encontro uma rosa, um lírio, sopra uma brisa leve e sigo em frente.
Porque não há nada mais prazeroso do que a brisa leve quando a tempestade medonha, que rompeu seu peito, se vai.

Ivna Alba

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Quanta indiferença...

O que lhe acontece quando está tão triste assim?
Ninguém deveria morrer de dor, nem muito menos de solidão. Nenhuma pessoa deveria ter o peito cortado pela tristeza.
Não deveríamos conviver com a desconsideração, muito menos com o aperto no coração.
Mas, quanta indiferença...
Quanta indiferença...
Eu gosto de fazer a diferença, da melhor maneira possível.
E quando não dá para fazê-la?
Aí, meu caro amigo, eu chamar-lhe-ei para o bar mais próximo.
E na loura mais gelada, no copo cheio de ar brindaremos ao amanhã.
E que ele traga muitas gargalhadas, esperanças e o sonho do futuro do depois de amanhã.
Porque se somos incompletos, que nessa incompletude sejamos serenos, e despertemos para o que há de melhor do cotidiano.

Ivna Alba

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

As fotos

Fotos, indubitavelmente, são os piores paliativos contra a saudade!
Olhando certas imagens que fotografei do pôr-do-sol do apartamento da minha nona, minha ex-moradia, senti uma certa saudade de ver aquelas belas visões e me deixar levar por horas, pelos desenhos refeitos por cada nuvem, entrecortando os raios, emuldurando novas paisagens de um 2009 que não poderia imaginar ser tão bom.
Mas, tudo é uma grande medida paliativa, como já falei!
Lembrando que, estando lá, não era feliz, começo a repensar em muitas coisas, esquecimentos - que para algumas pessoas - eram tidos como falta de consideração, contudo nunca foram.
Sinto-me imprestável quando gosto de alguém e falho com a pessoa, por puro esquecimento e isso me faz sentir uma impotência desgraçada. Cobro-me todo santo dia mais perfeição e quando não consigo atingi-la, minhas forças se esvaem por algum ralo das horas, marcadas no cuco.
Maldita imperfeição e esquecimento!
Tentar reparar as faltas, isso é o que tento fazer e peço desculpas com quem andei falhando, ultimamente!

Ivna Alba

domingo, 20 de setembro de 2009

A criação do nosso mundo

Eu criei um mundo lindo, dentro dos seus olhos. Era colorido e completamente preenchido de coisas boas. No meio do tudo e do nada, as músicas que lhe ensinei teciam repletas sinfonias de compassos amorosos e sedutores.
Em sete noites e sete dias eu lhe amei inteiro. E como sete é ímpar, sobrou alguém.
Sobrou-me o esquecimento, restou-me a falta de você.

Ivna Alba

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O primeiro

Na travessa do mundo, onde eras tu, onde fui eu, o primeiro homem em teus braços a passar.
Ali me afoguei em águas profundas e negras, sentindo o borbulhar dos teus afagos, sabendo onde nem eu sabia que poderia mergulhar.
Ali onde foste minha e eu teu.
Ali no anteposto e passado composto, ali onde conheci a modorra envergonhada de teus olhos de cansaço.
Ali onde nem ao menos ao léu eu poderia ficar.
Ali onde tudo era vago caminho de entreposto e ressalvas.
Ali na aurora do teu canto e de teu ressonar.
Ali onde nem ao mesmo tempo me fizeste crer, que no anoitecer de teus passos, eu e minhas raízes, poderíamos fincar.

Ivna Alba

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Descontrução

Descontrua o tempo em mil ponteiros descompassados. Então, me responda: "Qual o segredo de se olhar no espelho, e descobrir-se mais velho a cada piscadela? Eis a ciência que nunca há de se conhecer, a menos que se dê o próximo passo para o descaramento de se ver sem roupas e sem mentiras.

Ivna Alba

sábado, 29 de agosto de 2009

Homem, Humano, Humanidade

Ao que se interessa, pois
Finda que essa chama já se põe
Emplaca, não obstante
A forma, com a qual se consagra
Desabando em clausura constante
em meio ao grito e a fome,
ao mundo e a desordem.
Circuncidando o pandemônio, a paz.
Aquém do senil, a juventude.
Enlameando os sorrisos em lágrima atroz,
Distanciando as mãos e as bocas
Ressurgindo das cinzas do vento
Carregando em si
Toda sorte de ambiguidades.
Eis o congênito acre de tuas distâncias!

Ivna Alba

Sobre a tese de mestrado

Enfim, achei o rumo para o meu mestrado: o título!
É, porque diferentemente de textos normais, como: prosa, poesia, tese de mestrado é anormal e eu preciso do título para desenvolver a idéia. Com a quantidade básica de café para a noite de hoje, juntamente com o maço de marlboro red espero desenvolver o anteprojeto dele.
De novo, o mal entra nos meus trabalhos e eu só penso:
- Ivna, por que você só inventa coisa para esquentar a cabeça?
E meu outro eu, o eu louco, responde:
- Por que é bom esquentar a cabeça e viver coisas difíceis.
Aliás, bom mesmo é pegar algo dilacerante e tentar torcê-lo por inteiro; depois que se termina o serviço, olha-se para o monstro e diz: "Eu venci, ganhei, derrotei você"!
Acho que isso vem do meu instinto de não saber perder, de sempre desafiar o meu eu acomodado e incentivar, cada vez mais, meu eu louco.
Como as duas faces da mesma moeda, eu vivo no cara e coroa, torcendo para que o coroa sempre caia com a cara para cima... Exatamente isso!
Tudo nos seus conformes agora? Sim! Contagem regressiva...
Então lá vai, vamos brincar com: O diabo na rua, no meio do redemoinho e Constança, meu bem, Constança. Constante, sempre serei. Constante até a morte. Constante eu morrerei!

Ivna Alba

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Sambinha Antigo

Pensei que minha cama era macia
Que os lençóis brancos
Afogassem suas mágoas.
Pensei que meu teto fosse suficiente
Para esta culpa displicente
Que já não quero mais afogar.
Achei que meu lar não era vazio,
Que sua presença brilhava
Cada dia mais com a luz do sol.
Sonhei que nos seus beijos tão vagos
De quem vem e passa rápido
Ainda sim, guardavam amor,
Beleza, ternura e carinho.
Mas, hoje, tudo é diferente.
Passei a ser descrente,
Jogando fora seu frouxo amor
E, no samba encontro
Apenas, o amor que você
Nunca me entregou.

Ivna Alba

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Amanitta

Amanitta tinha um sonho: de crescer, ser bem sucedida, inteligente, rica, ter um lindo marido, um casal de filhos mimosos - daqueles que todas as tias suadas e cheias de pó de arroz beliscam as bochechas - um cachorro chamado Pimpão e uma linda casa com um jardim cheio de roseiras vermelhas.
Diferentemente do que ela desejava, cresceu, não conseguiu terminar nem o ensino médio - sua inteligência se comparava a de um pombo tonto - ganhava 10 reais por programa, o troca-troca de "maridos" era perene, soube que era estéril, numa consulta gratuita do programa hospitalar do São Camilo e o único bicho de estimação que ela tinha era uma catita que toda tarde lhe azucrinava as poucas imaginações, depois de uma manhã pouco dormida.
Depois de muito desejar, Amanitta caiu em si e despertou em um dia às 15:15, decidida a não mais seguir aquela vida de ânsias, que já se quedavam revogáveis.
Então, ela decidiu esperar... Sentada!
Pegou a cadeira menos desconfortável, apoiou-se bem ereta e ficou lá... Os dias se passaram, as noites também, e Amanitta sentada... A fome lhe invadiu, o sono irrompeu-lhe as pálpebras, os cabelos ficaram grisalhos e a mulher jovem se tornou uma velha, em pouco tempo.
Chegando ao fim de sua eterna desesperança, Amanitta remoía um passado fugaz de desejos frustrados e o corpo marcado de cicatrizes de um futuro que poderia ser, mas não fora.

Ivna Alba

terça-feira, 25 de agosto de 2009

E onde as idéias estão que não chegam?

Reclamo todo santo dia das idéias que me estão engasgadas, amordaçadas e entaladas na garganta como um bolo alimentar mal digerido e empancado no mesmo lugar.
E no caminho de ida e volta do trabalho eu me cobro:
- Chegar em casa vou escrever, vou terminar o romance, vou concluir a peça, vou finalizar aquele haicai!
Ou seja, vou vomitar você, maldita idéia errônea, que vaga em meus pensamentos e me deixa impaciente com seu atraso, retardo, mal gasto tempo incômodo!
E ela ri de mim. Caçoa várias vezes e continua lá: intacta, intocável, imóvel e irônica.
Ódio! Como fazer para destruir essa barreira imprestável da inexatidão das idéias que destoam na cabeça do escritor que nada mais quer da vida, a não ser pôr no papel suas vãs palavras desdobradas pelos sentimentos?
A resposta, ninguém sabe, ou ao menos, nunca disseram.
Peço, imploro, revolvo meu âmago em busca de ti, concreta idéia insana, que me apareças, mesmo que na surdina da madrugada e me visites.
Assim, quem sabe, descanso minha cabeça tranquila no travesseiro.

Ivna Alba

domingo, 23 de agosto de 2009

Ivna: não é um nome difícil!

Realmente, não é difícil!
Se vocês pensarem são apenas 4 letras, ainda possui a eficiência de ter o V mudo, ou seja, não é necessário pôr mais uma letrinha depois da pobre consoante, mas eu não sei por que as pessoas daqui tem tanta dificuldade em pronunciar ou escrever meu nome.
Posso citar aqui inúmeras formas que andam me chamando ou escrevendo meu substantivo próprio:
Ivína, Iona, Ivana, Ivina, Ývina, Ivyna... E por aí vai a lista medonha, cheia de aberrações e nomes medonhos.
O pior, foi Iona! Indubitavelmente!
Atendo o interfone do trabalho e o rapaz da transportadora fala de forma simpática:
- Entrega para a senhora IONA!
Soou dolorido em meus tímpanos: I-O-N-A!
Dois erros consistem nesta frase: Eu sou senhorita, não senhora! As pessoas esquecem que temos um pronome de tratamento para as pessoas que não senhoras. Outra coisa que entrou em desuso no nosso dia-a-dia! Triste desuso, diga-se de passagem!
O outro erro, nem preciso comentar. O fato é: na embalagem da correspondência havia um V muito digno e bonito, então por que cargas d'água ele meteu um O onde não havia?
Que os mais respeitáveis me perdoem, mas O só mesmo o que ele senta.
Chegou ao ponto de que quando fui fazer minha assinatura da TVA, a moça que fez o cadastro pôs meu nome de TINA. Isso mesmo, TINA! Depois disso, todo mundo que me ligava da TVA me chamava de TINA.
Bem, Tina e Ivna é como você e a Globo, caro leitor: Tudo a ver, não é mesmo?!?!
Então, aprendam, pessoas daqui: escreve-se IVNA e lê-se (ÍVINA).
Complicado? Não, complicado é não entender como 4 letras podem ser tão difíceis para ouvintes e letrados.

Ivna Alba

Comédias da vida (privada)?

Hoje está completando 1 mês e 18 dias que estou vivendo em Sampa!
Nesse pouco tempo de sobrevivência aqui pude perceber que em uma das cidades onde tem mais gente por metro quadrado do Brasil, mora a solidão.
A exigência de se ter amigos por aqui é tanto quanto ou igual a de se sobreviver: dificuldade grau 9, e olhe que sou comunicativa, caso contrário não teria feito comunicação social; escolheria biblioteconomia ou qualquer outro curso voltado para algo que não precisasse se comunicar.
Deixei cerca de trezentos amigos em Tubi City - nome "carinhoso" para JP - minha cidade natal, aqui conheci muitas pessoas já, mas surgem os problemas: tempo!
Fora o costume de se fechar no casulo - principalmente em dias de chuva - alguns paulistanos demoram a vida para ter tempo para sair, conversar ou até visitar as pessoas. O que não ajuda muito, também, é a imensidão da cidade. Trinta minutos de caminhada aqui é perto, em Tubi City era a eternidade.
As pessoas me ligam sim, mas combinar para sair são outros quinhentos totalmente diversos e inúmeros: trampo, trampo, trampo, trampo, chuva, trampo, trampo, ou é tarde!
Por que complicar o que pode ser tão mais simples.
Outra ironia: São Paulo é a cidade que não dorme! Conversa para boi dormir e roncar muito! Metrô e ônibus param à 00:00! Como pode se observar: é uma sobrevivência real, não virtual.
Virtual é a visão de um relacionamento afetivo - ponho novamente a amizade nesse ponto - que também não parece vingar com facilidade por aqui.
Ficar é fácil, difícil é arrumar um relacionamento fixo, estabelecido em bases concretas, como os milhares de edifícios daqui, conseguir uma pessoa que supra as características psicológicas e físicas (o que não faço tanta questão) por essas bandas.
Tudo é uma questão de sobrevivência e se torna uma "divina" comédia da minha vida privada. Agora, nem tão mais privada, porque algumas pessoas que visitam isso aqui já devem ou podem ter lido... Enfim! Isso é praticamente o fim mesmo do texto.
Acho que não estou sendo exigente demais. Querer desenrolar o seu ciclo social, somado a um namoro, não é tanta exigência assim...
O que não posso e não quero - até porque faz mal para a minha natureza extrovertida e expansiva - é ficar parada na cidade que "não para"!
Isso sim, é privação demais, na minha vida privada!

Ivna Alba

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Entre um cigarro e um gole frio de café...

Hoje recebi um email de minha amiga-divisora-casa, sobre uma manifestação anti-corrupção, para expulsar Sarney da nossa famosa e ardente cúpula do politicagem.
No respectivo citavam os caras-pintada... Enfim, depois dessa citação, só mesmo as reticências. O que fizeram essas criaturas? Foram eles que puseram o engomadinho Collor para fora da República? Seria muita, mas muita inocência pensarmos assim. Desde que o mundo ainda era a Pangéia, que o Brasil era Brasil, que tenho conhecimento da História do nosso país-continente, que sei de uma coisa: quem move quem está no poder é quem, também, nele está.
Não se iludam durante os anos em que não há eleições! Nem muito menos, durante as mesmas. Tudo continua como era dantes no quartel de Abrantes e assim será!
Porque, ao invés de fazer esse manifesto em negro, não se grita e param a Paulista, ou que avenida principal seja, para termos melhores condições educacionais, sociais, de saúde e melhorias de emprego, melhor repartição do dinheiro público, que doamos - ano após ano - no IR? Agora vamos nos rebelar com algo que nós mesmos criamos, demos respaldo?
O que é isso? Piada de mau-gosto da Praça é Nossa?
É, porque agora, só falta aparecer a mulher-não-sei-que-fruta-ou-legume-agora, para se candidatar ou desfilar na ilusória manifestação contra o Sarney.
Como eles temos muitos no Planalto Central, naquele esgoto que é Brasília! O Juscelino se tremelica na tumba e eu me remexo de ódio quando leio essas palhaçadas rebeldes e intolerantes contra esses marginais de gravata.
Que desejo IMENSA, INCOMENSURÁVEL e DESMEDIDAMENTE a saída deste velho corrupto, sedentária pulga que rouba nosso país há anos, isso vocês podem ter certeza: EU DESEJO! Mas, não posso deixar de explicitar toda a minha revolta diante estes protestos retardatários e inúteis, que nada farão.
Acredito que força popular mesmo, mesmo só houve, nesse país, na Ditadura. No restante da História Brasileira os revoltados eram mortos, ou fugiam, ou ficavam sozinhos gritando ao relento... E depois morriam ou eram presos.
Caras-pintada? O buraco, naquele época, como hoje e sempre, é muito mais embaixo...
Parem de se iludir hoje, deixem para se inebriar com inflamação no Carnaval, vendo a Vai-Vai passar ou a Mangueira...
Façam o que tem que fazer na urna e não depois. Ou implodamos Brasília e todos os antros de politicagem explícita e repugnante desse país.
Na minha opinião, político deveria ser como o programa: Amigos da Escola! Fazer, sem receber. Por que não? Trabalharia pelo país quem realmente quisesse.
Eu me revolto com tolices, babaquices, faixinhas e gritaria na época errada!
Ô povinho mais imbecil, subordinado e cego!
Para você que acredita que o Sarney vai sair do poder por conta dessa revolta, faça o seguinte: nas próximas eleições pegue seu dedão, mele na tinta e pinte a cara, depois saia gritando e atordoando cada indivíduo que passar na rua.
Sabe como é o nome disso??? Pois eu lhe direi agora: É DEMÊNCIA!
Desculpe-me pelas palavras um tanto sinceras, curtas e grossas, mas é minha opinião, tenho o direito a isso e antes que se crie uma LEI-ANTI-VERDADE-SINCERIDADE-LIBERDADE-EXPRESSÃO, como criaram a lei anti-fumo, para bares, restaurantes e locais públicos (em ambiente aberto, em SP), eu falo logo.
Ressalto que as manifestações, protestos e toda essa coisa é positiva, quando feitos na época certa! Não adianta chorar pelo leite derramado, Inês é morta e Ana Bolena também!
O cigarro já se foi, o último gole de café idem e fico por aqui.
Quem gostou, obrigada! Quem não, problema seu, esse blogger é meu, lê quem quer, os incomodados que se retirem e não estou coagindo você para seguir até o fim destas linhas, portanto, a porta que quer sair é a mesma que entrou.
Aqui impera a lei: LIBERDADE! Não gostou? Existe um link aí embaixo que diz: COMENTÁRIOS! Viu? Beleza!
Até mais!

Ivna Alba

Acima das nuvens cinzas

- Ah, já entendi...
- O que?
- Dá aqui o dedo.
O homem pegou o polegar de Nonô e emplacou-o na almofada negra, cheia de tinta escura, enfiando-o depois no papel.
- Pronto! Agora é só esperar que a justiça lhe seja feita.
Nonô ficara na cela imunda, cheia de escatologias submersas e subliminares, intrínsecas àquele mundo que ele chamava de Babilônia Perdida. O polegar borrado com a tinta negra, formando o desenho de sua identidade, onde ele não sabia se jaz sua personalidade, ou seus descaminhos.
Como saber do que não se tem idéia? Ao lado, Abreu lhe perturbava com a gaita, na frente Jurubeba sussurrava e choramingava o leite derramado, o cubículo lhe apetecia o estômago por vezes sacudido pela fome e, depois, vinha-lhe a desinteria escorrer-lhe pelas entranhas.
- Homem, para com essa porcaria.
O velho parava e colocava a gaita no chão, olhando-a como se desejasse os seios fartos de uma mulher jovem.
Há muitos anos, Nonô pensava se não seria melhor ter voltado para a cidade em que nascera, mas de que adiantaria estar lá, se nada de melhor acontecia. Mas, e ali, Nonô? O que ocorreria de bom naquele lugar, que não empregos miseráveis e a falsa verdade de que o céu estava perto?
As migalhas de esperanças que pouco lhe restavam o vento zarpara com as mesmas, deixando-o imerso naquele vislumbre sorumbático de mazelas e disparates. Nem bem amanhecia o dia, ele corria para o buraco feito na parede chapiscada, a qual chamava de janela, e caía no desvaneio de pensar que tudo aquilo era uma espécie de sonho maldito, que aquela realidade logo se dissiparia e ele, Nonô, homem de meia idade, crioulo nascido em Barbacena, encontraria seu paraíso repleto de harmonias e cachaça da boa.
E Nonô se ria por inteiro, gargalhava solto, coçando a barriga imensa, onde guardava meio litro de desilusão e vinte quilos de solidão.

Ivna Alba

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Este blogger não parou... Eu juro!!!

Gente,

Se alguém lia ou lê este blogger, saiba que ele não parou!
Mas, muitas coisas aconteceram desde a última postagem, o que me fez estagnar um pouco a imaginação e a criatividade.
Resumindo os passos derradeiros: minha amiga Lorena Xuxu saiu do emprego em que estava em SP, indo para uma editora e me passou para a vaga dela. Resultado, vim parar em SP (aquela cidade que dizem não dormir nunca!) Pura balela!
Os ônibus param meia-noite e o metrô também, então você só tem uma opção: táxi! Que se torna inviável para uma habitante que não ganha muito, como eu.
Mas, eu AMO essa cidade, impossível não amá-la.
Então o conto que vem a seguir, se chama: Acima das nuvens cinzas.
Até a próxima postagem!

Beijos e Abraços paulistanos, sem gripe suína!

Ivna Alba

domingo, 21 de junho de 2009

Antes de ontem...

Na sessão de terapia:
- Como foi sua infância?
Breve pausa. Iniciava-se uma série de palavras pronunciadas com conexão, mas balbuciadas, até desatar no mais profundo chôro.
- Minha infância foi muito feliz. Acho que não houve época mais feliz em toda minha vida.
E dentro do âmago era consciencioso que não se deve chorar por algo alegre, contudo a vaga lembrança de que se soube assim, por alguns anos, trazia aos olhos uma repleta gama de reminiscências líquidas.
Gotejavam não apenas as proezas de subir na árvore que se dizia Pé de Manga Baixinho, como liquifaziam as tormentas e as angústias de ver o antes de ontem ficar tão atrás e não se tornar o amanhã possível de seus dias.
As acerolas colhidas pela manhã em seu xale neblina, a foto sentada no colo da mãe que parecia acordar naquela hora, as pancadas da massa do pão na mesa pela tardinha, as brincadeiras com a terra, com as plantas e os ternos e eternos carinhos da mãe - inexplicável e afável sintoma de recordações felizes e admiráveis.
Passou por um momento em sua cabeça, ao entrar no corredor branco e vazio, que se sentira amada apenas na infância. E nesse breve rato sucumbiu à realidade de não ter na lembrança outra pessoa que não sua mãe, ao lhe ver, tomar nos braços, sorrir e lhe amar.
Os outros rostos?!?
Alguns nas cadeiras, estáticos, pétreos e enevoados.
O pior, não era saber-se infeliz, mas ter aquele nó de berreiro preso na garganta e reprimir-se diante de tudo e todos.

Ivna Alba

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Catamira

Esquálida!
Assim poderia ser descrita Catamira.
Definhando todo o dia mais um pouco, em todos os sentidos. Catamira era um gênero que não poderia ser chamado de mulher, não parecia haver sexo em sua pele, nem em sua vida, muito menos em seus genitais.
Criatura de quarenta anos e poucos, morava em um quitinete de cozinha, quarto e um resto de sala, onde não recebia visitas e o fogão estava quase sempre desligado. No banheiro de azulejos brancos e com lodo entre o rejuntes, acumulavam-se os resquícios de vísceras do trabalho enfadonho e demente.
Débil enfermidade de pulsações: em seu ventre eram as únicas oportunidades de se sentir viva, vez em quando, depois do almoço.
No mofo a pouco e monótona conversa do fim de dia. A solidão enternecendo o colchão furado e umedecido pelas goteiras, nos dias de inverno.
Catamira não sabia o significado de muitas coisas e pouco relutava com isso - talvez por desistência, ou por insistência em não querer se atormentar por algo que estivesse há tão longíquos tempos luz.
Mas, naquela noite fora diferente. Verdadeiramente, há muitas semanas a diversidade se categorizava-se por um abscesso recorrente e intragável na parte interna da coxa magra, quase rente à virilha. Escuro e purulento. Aquele não desistira tão fácil da mulher.
As pernas com os pêlos grudados pela água e sabão, e Catamira tentando espremer o caroço inflamado. Na desistência, melhor esfregar o resto do corpo, tocando e retocando as costelas, os seios murchos, as pernas, joelhos, braços, cotovelos, costas, as nâdegas e o ânus cheio de pentelhos.
A água escorre e Catamira sente que o resto do resto se esvai pelo ralo, e junto com ele, ela.
E o abscesso que não se transfigurava, apenas aumentava com a indiferença do mundo.
Uma mosca que vai e vem, uma vontade de nada dançava nas pupilas e ingressava na íris, circundando uma apoteose de vagar, em seu absurdo e pungente tormento.
"Que fazer, Catamira? Quem é você, Catamira? O que é você, Catamira?"
O espelho minúsculo de bordas verde-limão era embaçado com o hálito morno. Mas, pouco importava se olhar, se ao menos ela pudesse se ver livre daquele tumor, estaria satisfeita com a vida.
Na cabeça, uns poucos versos da modinha que ouvira antes de chegar em casa, a luz fraca do quarto/banheiro, os dejetos de lembranças do ano anterior e o abscesso ardendo-lhe entre as coxas.
"Pensar, é coisa para quem sabe, Catamira. Você é só mais uma criatura. É a massa, Catamira!"

Ivna Alba

domingo, 7 de junho de 2009

De amor e de bemol

Vês, minha pequena:
Eu me perdi em ti e tu em meus braços.
Escuta o barulhinho da luz do Sol e me diz
Fala baixinho, mas diz que fui eu que te criei em mim.
Deixa-me segurar em tua mão e sorrir.
Lembra daquele bemol que fiz em teu modo menor.
Correrei aos teus apelos,
Mergulhando em teu pacífico
Mas, já será tarde...
No meu amor sustenido
O teu tom desafinou no meu.
A harmonia que eu fiz você esqueceu.
O nosso arpejo nunca mais se encontrou.
E do meu allegro fez-se o adágio
Enquanto no teu scherzo esqueci
Os nossos laços.

Ivna Alba

sexta-feira, 5 de junho de 2009

O Leão está solto nas ruas...



... por descuido do seu domador!!!

"Bob Charles" é um gênio e tem bicho pra tudo nesse mundo!

Ivna Alba

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Angelo Alba

Eu quero ter um filho!
Peguei-me pensando dias atrás, depois que conheci Você!
Eu quero ter um filho, que se chamará Angelo - assim como meu bisavô - sem acento mesmo, o tom forte no A virá com sua personalidade, que não serei eu a ditá-la.
Angelo será uma criança linda e feliz: olhos azuis e grandes, cílios pretos e longos; muito branquinho, macio, cabelos negros lisos e um sorriso de encantar o mais duro dos seres humanos. Serei sua mãe que chorará ao vê-lo deitado e quietinho em meu colo, ao nascer.
Ele sairá do meu ventre, forte, viçoso e sadio, porque obviamente eu me disporei a passar 9 meses sem fumar por ele, para que nasça perfeito. E gerarei um ser perfeito, forte e rijo para esse mundo insano.
Ele apreciará as artes, a boa música, o teatro, o cinema, gostará de beber, se quiser fumará, não sei se desejará provar maconha ou algo do tipo, mas eu quero que ele crie a personalidade dele, e sempre que precisar eu lhe direi: "Certamente, isso será melhor, meu filho!"
Angelo não será batizado, porque terá a escolha de saber o que é melhor para si, mas Você dirá se quer ou não indicar o caminho de algum lado espiritual para ele.
Antes de tudo, Angelo será um homem educado, e não dessas crianças atuais, que gritam e batem nos pais.
Angelo, desde já é amado, mais do que qualquer outro ser deste mundo, por mim.
Não sei se meu filho será uma produção independente. Isso vai depender de Você.
Mas, já me vejo grávida, com um sorriso perfeito em meus lábios ao vê-lo me chamar de Mãe, pela primeira vez.
E já me vejo plena ao receber Angelo em meus braços.
Angelo Alba: meu rebento e minha felicidade!

Ivna Alba

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Santo MP3!!!

Eu agradeço todos os dias ao homem ou a mulher santo/a que criou o MP3!
Vocês, leitores, podem até pensar:
- Mas, já faz tempo que isso existe.
Claro que sim, já tive inclusive um de 128MB, mas a tecnologia é outra coisa bendita. Investir dinheiro em roupa? Sapato? Cabelo? Unha? Depilação? É bom, vez em quando, mas juntar o seu vil metal e comprar aquele celular com tudo que você quer, de mais ultra, super, power, hiper moderno é a melhor coisa que existe, em minha opinião.
Pelo menos para mim, que adoro ficar repetindo uma música que amo. Coisa que a maioria das pessoas reclama horrores. Esse ERA um dos meus maiores defeitos, para as pessoas que conviviam comigo - minha irmã que acompanha este blogger vai ratificar com muita veemência, ao ler isso aqui - mas que graças ao MP3, isso deixou de existir.
O máximo que pode acontecer é a audição ficar um pouquinho estragada, mas fazer o que? Tudo tem um preço.
Não tem nada que pague você poder andar pelas ruas e não precisar ouvir certos sons desagradáveis, como carrinhos de Cd's piratas tocando aquele Axé miserável.
Faço o meu dia com a minha trilha sonora. A música para mim é uma das coisas mais agradáveis que existem e não há alegria maior quando acho aquele som na Internet, baixo, passo para o celular e posso ouvir milhões de vezes, sem me preocupar com a maldita frase:
- Meu Deus! Troque essa música!
Não, caríssimos, o século XXI é tão maravilhoso a ponto de guardar sua individualidade, seus gostos, seus estilos e aquela sua mania, que para muitos pode ser extremamente desagradável, e fazer da sua vida a paz eterna.
As risadas, as conversas, os olhares, o andar das pessoas, a pressa dos carros e a vida ganham a trilha que eu quiser, e com isso, muita coisa fica guardada melhor na lembrança.
Não nego que nada supera também a alegria de sentar ao banco do piano e tocar o que quiser, na hora que desejar.
Cartões de 1, 2, 8, 16GB: isso soa perfeito!
Isso não apenas soa perfeito, é perfeito!
Próxima aquisição?
Meu notebook com bluetooth, para não precisar de fios para passar e repassar o que for desejado.
A tecnologia é insuperável!
E o MP3 é sublime!

Ivna Alba

terça-feira, 26 de maio de 2009

O romper dos sons

- Onde?
- Naquele restaurante chinês, no segundo piso do shopping.
- Aquele da semana passada?
- É. Tá bom para você?
- Bem, se você quer lá, pode ser sim.
- Quero saber se fica bom para você.
- Fica, mas tem que ser uma hora cravada, tá?
- Tudo bem. Pelo menos, você conseguiu se decidir em algo.
- De novo, Ana Lúcia? Começou cedo?
- Não, não. Foi apenas uma observação... Nada demais.
- Tá certo.
- Até mais tarde, Ângelo!
- Até, meu amor!


******************************* Ângelo

Desligara o telefone.
Ela havia sido mais rápida que ele, ou apenas os beijos de despedida não fizessem mais parte do cansativo repertório dela, assim como os outros trejeitos carinhosos.
Ele deixara beijos ao léu, para que o colega ao lado não suspeitasse que a mulher amada fora objetiva e clara.
E foi além, disfarçando um derretimento em formas de juras de amor dela por ele.
Botou o aparelho no gancho, arrumou os papéis, o mouse-pad, a cadeira, o teclado do computador, soltou um longo suspiro, constatando que tudo estava em prumo e ele no rumo.


****************************** Ana Lúcia

- Até mais tarde, Ângelo!
- Até, meu amor!
A mão e o braço deslizaram inconscientemente até o aparelho e o estampido do fone no gancho lhe soou forte como um gongo.
Olhou para o relógio: faltava meia hora para o meio-dia, levantou, pegou a bolsa, o casaco e deixou tudo como estava em sua cabeça.
- Doutora Ana Lúcia?
- Sim, sou eu, pois não?
- Correspondência. Preciso que assine aqui.
O papel cheio de códigos, a barra de numerais embaralharam a visão. Pensou em Ângelo, pelo menos naquele dia e situação não deveria deixá-lo esperando, e sua consideração final mostrar-lhe-ia todo o respeito que nutrira uma vez por aquele redator de casos policiais.
"Redatorzinho amarelo..." - pensava consigo e se ria de todo o apelido que a levara até ali, exatamente àquele ponto entre a porta do elevador, o papel cheio de números, a caneta e o suor requentado e gorduroso do carteiro de olhos cor-de-mel e dedos borrados de tinta azul.
- Doutora?
- Por favor, deixe com minha estagiária, ela assinará.
- Mas...
A porta do elevador fechou súbita, deixando o mau cheiro para trás, recortado por muitos andares, esquecido pelo aço da cabine e tijolos embalsamados de irrealidade e concreto.


******************************Da gênesis

Ana Lúcia casou-se "eternamente" apaixonada por Roberto.
Advogada e engenheiro civil.
Ela continuou o que era, ele transformou-se em um obeso e poderoso empresário do ramo da construção.
Casaram-se e decidiram contribuir com a espécie humana, mas ele era estéril. Não que ela se importasse nos primeiros dois anos, mas ir aos chás de bebês das amigas lhe levava aos prantos, sempre que entrava no carro, na volta para casa.
Roberto entendia os olhos inchados e as monossílabas.
Ana Lúcia fartava-se em lencinhos de papel, e ao fim lá estava o calmante e dezenas de lenços amassados no cesto de lixo do banheiro. Por sua vez, o marido engolia o cowboy cinco vezes seguidas e pensava em qual seria o jogo do domingo, ou o seu mais novo empreendimento.
Durante cinco anos, dois meses, três semanas e um dia, Ana Lúcia sofreu e trabalhou, até o momento em que conhecera Ângelo - o redatorzinho amarelo - na festa de inauguração do luxuoso residencial de Roberto.
O jornalista e a advogada encantaram-se de primeira piscadela, até o último beijo daquela noite. Porque ambos não tiveram ressalvas.
Desejo é desejo e a carne é fraca.
O caso ia bem, até que ela engravidou. E mesmo sem saber, abortara na terceira semana de gestação.
- Seu útero está retorcido, Ana.
- Como assim?
- Você abortou.
- Impossível! O Roberto é estéril.
- É difícil, mas as vezes pode acontecer de vingar em uma ou duas tentativas.
- Grávida?!? - ela sentiu o rosto ferver, uma sensação de vazio e frio tomou-lhe conta do peito e entranhas. "Incompetente, impotente!" - um misto de consciência lhe xingava e devorava o resto de amor próprio.
Ali mesmo ela abriu os pulmões e dilacerou-se.
A médica tentou reconfortá-la, porém foi em vão. Calmante e lencinhos: a receita de Ana Lúcia contra os infortúnios, e que desta vez não resultou em nada.
A crise foi forte.
Os braços de Ângelo a confortariam.
E todo penso é torto. Ele não fez alardes, nem entrou em choque, apenas recebera a tragédia como quem ouve sobre a alta do dólar.
- Isso não daria certo, meu amor.
- O que?
- Ana, você é casada.
- E o que tem?
- Ainda quer que eu lhe explique?
- Ângelo, era um filho nosso.
- Ana, não existe espaço para um filho na nossa relação. Eu já lhe falei sobre isso.
- Como é? Acabo de perder nosso filho e você é insensível ao ponto de vir com essa conversinha racional para cima de mim? E o seu amor profundo e incondicional? E suas declarações? Onde estão, hein Ângelo? Estou sofrendo, sabia? Mas você liga? Não! Você não liga!
- Mulher, para se ter um filho é preciso ser racional, coisa que você não está sendo agora.
- Seu estúpido, grosso, imbecil, desumano!
- Ana! Pára e me ouve!
- Não quero ouvir nada de você. Nada!
- Ana, meu amor, me escuta!
- Largue meu braço, senão eu lhe mordo! A partir de hoje pode cantar em outra praça, seu jornalista medíocre!


***************************Cantando na mesma praça

Meia dúzia de ramalhetes brancos e vermelhos durante um mês e Ana Lúcia voltou a frequentar os lençóis do redatorzinho amarelo.
Ela esvanecia de prazer, mas os tempos mudaram demais.
Os sonhos eram quebrantáveis bolhas de sabão e ela sabia da outra face do amante.
Voltara apenas, porque em casa perdera a competição e os poucos carinhos para o futebol, o cowboy e as garotinhas da internet.
- Venha viver comigo.
Ela ficava em silêncio e sempre arrumava uma outra história ou desculpa, enquanto Ângelo lhe entornava dezenas de perdões.
Aquilo estava amargo e dissonante demais, para a sua Berceuse.


***************************O quebrantável romper dos sons

Cinco minutos atrasada.
Ele chegara e servia-se, enquanto conversava com uma moça esguia à sua frente. Se tivesse uns vinte e oito anos era muito. Ambos riam entusiasmados com toda e qualquer bobagem.
Ana Lúcia não se atreveu a dar mais nenhum passo e ficou estagnada, observando e, por um instante, mais breve que fosse, ela sentiu-se confiante para fazer o que viera fazer ali.
Mais dois minutos, a mulher de 36 anos saía do shopping e se sentia plena.
Ele abria o bilhete entregue por um rapaz da limpeza da praça de alimentação.
Do riso ao mais profundo silêncio.
Ângelo quedou-se absorto pelas palavras secas e duras, perdendo o rumo e o apetite.


****************************Os sons

Em abril, do ano seguinte, Ana Lúcia abria a porta do seu novo apartamento, trazendo nas mãos várias sacolas de supermercado.
Cantarolava "A felicidade" e nunca fora tão feliz com sua barriga de nove meses.
Ouvia músicas em alto e bom som.
Comia brigadeiro na panela.
Sorria para o espelho, apalpando os seios e pensava: "Como haviam crescido".
Chorou a plenos pulmões ao sentir seu filho em seu peito, pela primeira vez.
Desta vez, sem receitas contra infortúnios.


Ivna Alba

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Trague, mas não solte!

Esse título precisa tanto de uma exclamação, quanto preciso de uma paixão hoje. Paixão? Não, eu diria de um amor que seja possível. Não me interpretem tão mal assim. Alguns erram hoje, acertam amanhã e assim a vida é feita de momentos felizes, eternos, ruins e horrendos.
Quiçá eu tenha acertado na dose, mas errado o alvo, da primeira vez. E agora?
Já se permitiram não amar, alguma vez? É o que pode existir de mais desunamo na vida. E o pior, destrutivo consigo mesmo.
Se é para ficar sozinho, que se faça, mas nunca se diga: - Por hoje chega! ou: - Fechado para balanço!
Se é balanço que se quer fazer, o faça, mas deixe novas mercadorias entrarem na sua bodeguinha, talvez uma delas faça sucesso e lhe renove os ares, dê a você novas esperanças, lhe faça regozijar um pouco mais a vida e dos momentos felizes e inesquecíveis.
Estou deixando que ele me bata à porta dessa vez.
Acredito merecer um pouquinho de sorriso, diante de dias tão pesados.
E onde fica o trago nessa parte?
Exatamente nisso: viver o possível, sabendo que ele é impossível.
Contudo, será realmente impossível? E quem o saberá?
A construção de conjecturas em minha mente é como a Torre de Babel. Parece nunca acabar e some em meio às nuvens que carrego dentro do peito.
Pelo menos, dessa vez, sei que estou me permitindo ao amor, à paixão, mas sem chegar a tão alto mar.

Ivna Alba

terça-feira, 14 de abril de 2009

Sangrar é respirar

Essa mesma massa, submersa nas suas vidinhas simples, e que se basta, resguarda um âmago que se move freneticamente, diverso de cada um...
Igual, porém, ainda sim diverso...

Ivna Alba

sábado, 11 de abril de 2009

La donna della fontana

È stanca...
La donna della fontana.
Ma è bella come la notte in tuoi bracci.
Potrai amare questa donna.
Ma tuttavia lei potrà sperare checchessia di te...
Forse possiamo desiderare le labbra di questo vento
Che, allora, ricambierà su' anima...
Giuochi con me, donna!
Rida con il ragazzo che ama te!
Viva, bella!
Non hai perche avere con sé
tanto brivido in tuoi occhi...

Ivna Alba

domingo, 5 de abril de 2009

O Triunfo da morte


A humanidade lançada às redes do destino inexorável. O temor que se apodera dos homens desde que foi implantada a consciência cristã, no mundo. A sensação de culpa, pecado, vergonha, piedade, misericórdia e clemência.
É disso que em uma breve leitura se faz, imediatamente, do quadro de Pieter Bruegel, O triunfo da morte.
Don DeLillo, em 1936, já faria seus comentários sobre a obra, datada de 1562, e que se encontra em Madrid, no Museo del Prado.
A tela, muitos antes de ser uma esplendorosa arte, amparada pelo Feio e Grotesco, denota uma espécie de Dança Macabra entre a vida e o confronto final com o derradeiro suspiro. É a luta, a batalha que cada um deve travar por todos os segundos em que sente seu inspirar e expirar.
Da forma como se observa, pode se destacar o temor e o terror das massas pecadoras, diante a iminência do transpasse, que certamente não era bem acolhido na época. Talvez ele nunca o seja.
É remetida constantemente a idéia de destruição, em todas as partes, inclusive no canibalismo do cão esquelético trucidando calmamente um recém-nascido, ainda nos braços da mãe que já sucumbiu à ceifadora. Se ele está com vida, ou não, quiçá não seja de grande importância, mas sim o fato que neste detalhe pode-se achar o início e o fim da idéia de Bruegel, ao denotar nesta cena o encontro de símbolos que evidenciam uma presença do futuro e o outro como prisma fundamental do quadro: o triunfo, a vitória da morte. O carnívoro como o triturador do futuro. A máquina que usurpa a esperança. Enquanto o destino e pretérito se encontram, os personagens que ainda possuem algum sopro de existência batalham pelo desejo que ainda lhes resta de viver, em meio ao cenário perturbador e desolador que penetra no âmago do contemplador. O firmamento incendiado, as cruzes que esmagam os combalidos e semi-vivos, os esqueletos que imperam perante uma terra áspera e seca.
É um cenário dantesco, muito embora não remeta ao inferno, nem purgatório, mas sim ao pensamento inicial e hediondo que o cristianismo conseguiu alastrar.
Os pecados mortais e capitais! Todos eles pisoteados e corroídos por esqueletos vivos. Alguns poderiam dizer que este tipo de arte não seria legítima por se utilizar do Feio e, assim mascará-lo com a Beleza e a grandiosidade da arte, produzindo a inverossimilhança, mas é nesta que reside o esplendor da arte. É emergir com outras categorias estéticas a valia maior do artista e pôr no que vê a crítica do que seria soberbo, para ele.
Outro ponto é inegável na obra, no tocante à natureza, que inegavelmente se mostra avassaladora, para com os homens. Toda ela se apresenta voltada ao fim.
E concomitante ao que o cristianismo tenta fazer com os homens, levando-os a temer a morte, Bruegel nos põe algumas dúvidas: se há lutadores é por que o fim não é iminente? Se existe uma lança transpassando o nosso terminal inevitável, é por que este não necessariamente é implacável?
O triunfo da morte, muito antes de ser uma marca impregnada de culpas, pecados, pessimismos cristãos, eternidade, é sim um início de que o final é e deve ser escrito por cada um da forma que deseja, seja na luta pela vida e pela esperança, seja na consciência de que o valor de uma vida não deve sucumbir por completo aos sentimentos cristãos de pessimismo, e a idéia de que a eternidade compensa o sofrimento e a angústia que a humanidade sente, mas sim de que é na vontade e no instinto humano que a vida e a história se sobrepõem, vencem e triunfam.
Se a morte é a nossa última estação, que a alcancemos, mas da maneira mais consciente e humana possível.
Nietzsche estava correto ao dizer: “A vida foi isso? direi à morte: Então mais uma vez!”.

Ivna Alba

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Apertem os laços

Esse momento chegou!
É inevitável que ele chegue para todos os seres humanos.
O que vai diferenciar é o modo como cada um encarará esse aperto, fechamento ou final de ciclos. Lembrando da música, Aos nossos filhos, onde Elis Regina canta com uma das maiores emoções, já vistas na música brasileira: "Quando colherem os frutos, digam o gosto pra mim."
O que já está no final, que não se pode tornar um início? O que seria esse eterno prosseguir e retroceder?
Para aonde se deve caminhar? Se se não sabe onde chegar, como se pode achar o lugar certo em que se pode jogar as malas e dizer: "Esse aqui é o meu lugar!"
Essa busca incessante é extremamente cansativa, mas ainda mais exausta é a procura e o encontro. Há coisas que somente o homem consegue achar sentido.
A vida deve sim, ser muito mais do que as convenções que nos ensinam quando pequenos. Só não encontraram ainda o seu sentido maior, e talvez por isso os progenitores enrolem e desenrolem os novelos das histórias do que-se-deve-ser e do que-se-deve-querer-ter.
Mera peça embolorada pelos anos de simulacros.
Os dias são assim?
Eles eram assim?

Ivna Alba

terça-feira, 24 de março de 2009

Wania

Um frio marmóreo lá fora.
Silêncio no banheiro.
Pela janela do cômodo se tecia o cinza e os flocos de neve.
Pés ebúrneos deslizam e pousam suaves em frente à banheira. A mão delicada de Wania abre a torneira e a água quente desaba lânguida perpetrando todo o vazio.
O corpo era magro, flácido, sem nenhum frescor mais da juventude, muito menos atrativos exarcebados pela natureza feminina. Wania era comum como aquele silêncio e o vazio.
Sentada na borda da banheira, a carne das nádegas cedia ao peso dos ossos, deixando uma grande marca vermelha. Pernas cruzadas, os dedos dos pés encolhidos, as mãos imprensando os dedos. Ela os prendia até arroxearem, depois soltava; assim podia ficar por horas. Os braços eram finas lascas de pele e esqueleto, algumas marcas de apertões e chupões gravavam sua história por algum espaço de tempo, assim como os seios murchos cediam mais ao pretérito, que ao atrito e as clavículas expontâneas.
Wania gostava de cruzar os braços na frente dos seios e apertar os ombros com as mãos em conchas, punha a cabeça para trás e olhava pelo espelho a garganta se transformar em arco. O rosto se fazia pleno, na calma. Cabelos castanhos, sobrancelhas finas, boca pálida, tez quase encerada pela falta de vida. Vida que não sabia viver desde que nascera.
O nariz pontudo só era percebido no perfil. Sentia tudo. Sentia pelo ar os desastres e bem-aventuranças que poderiam ocorrer.
A água quente queima-lhe o bumbum. Hora de imergir.
Lá fora, o plúmbeo acena.
Dentro, a água espalha um abafado ruído.
Ao entrar, Wania desloca a água, fecha os olhos e entra inteira na banheira.
Ao pôr a cabeça para fora a audição sensibiliza a atenção. Não, não iria olhar para trás, muito menos para dar cabimento.
Apenas sentia a respiração e o calor se aproximando. Aquela respiração deixando a pele mais úmida e quente. As palavras sussurradas ao ouvido deslocando gotículas minúsculas de saliva e alta temperatura, amolecem as pálpebras de Wania e os cílios se tornam um só trilho.
Não houve toque, apenas o saber estar.
A garganta como arco, os trilhos, o calor da respiração e o balbuciar como única forma de penetrar-lhe.
Paulatinamente, uma sucessão de movimentos esparsos e conexos retumbou do silêncio ao eco.



Ivna Alba

segunda-feira, 23 de março de 2009

Achados inesperados

Eco la meraviglia dell' internet!

Rodando pela Rádio Uol, que para mim, é uma das melhores coisas desse mundo virtual, encontrei - acredito que seja um grupo - chamado: Rabo de Lagartixa. E desse Rabo achei um álbum de nome: Villa por chorões.


Ou seja, quem curte um bom chorinho e o Villa está aí uma ótima pedida.

Sim, claro, aqui está o link para quem deseja ouvir, ou descobrir esta oitava maravilha do mundo musical:

http://b.radio.musica.uol.com.br/radio/index.php?ad=on&ref=Musica&busca=Villa+por+chor%F5es&param1=homebusca&q=Villa+por+chor%F5es&check=disco&x=17&y=8

Divirtam-se!

Ivna Alba

domingo, 22 de março de 2009

No momento...


A pausa para o café e cigarros regados a conversinhas para boi dormir da mamãe Joana.
Abraços aos que passaram pela Alameda dos Olivais, hoje!
Beijos aos que não deram outra opção, a não ser a de continuar sobrevivendo!
Ciao ciao, ragazzo degli occhi beli!

Ivna Alba

quinta-feira, 19 de março de 2009

Porque criar no "péntxi" faz bem...

Mesmo que seja uma bobagem bem boba!



Ivna Alba

En la tierra de los malucos cubanos

Um dia estou cá, sentada em frente ao computador, olhando para este blogger e pensando:
- Qual é a do cardápio de hoje?
E como não tinha nada para me inspirar, corri para o google imagens e digitei: "Cuba+prédios antigos".




Entre as várias artes com o rosto do Che, bandeiras do país, surgiram, obviamente, lindas obras arquitetônicas antigas e comecei a pensar nas pessoas que habitam ou habitaram essas maravilhas. O calor subiu-me no corpo, só de imaginar aquele sol dourado, numa tarde de verão. Pensei nos velhinhos de grandes dentições, as camisas de botão abertas até o peito, os charutos e a música fervendo entre aquela roda de homens senis. E a alegria daquele povo tomou conta da minha curiosidade.



O vento abrandou-me o rosto suado. As ruínas sempre me pareceram mais belas que as novas estruturas de concreto puro e espelhos. Claro, modernidade é algo que se aprecia, por ser nova. Acontece até com a escolha dos parceiros. Qual jovem de 20 apreciaria um outro alguém de 95? Pessoas idosas encantam pelo conhecimento, pelas rugas minúsculas e maiores que carregam inúmeras histórias diferentes, sabedorias e guardam um certo mistério, quando se pensa: "Quantas coisas essa pessoa já viveu?" Parece-me ser esse mesmo mistério que guardam os edifícios antigos. A própria forma um tanto acabada, quase se debruçando pelo chão, aquelas pedras largas e carcomidas por Chronos, aquele mofo ou lodo escorregando dos olhos das janelas e portas, como se pedisse para a vida não se findar ali. E, a existência não se dá por vencida. Aqui e acolá se encontram ervinhas que brotam de um barro evadio, entre um tijolo e outro, da construção.


E por falar em janelas e portas, lembrei-me de recostar meu corpo nas balaustradas de um desses prédios. As palmeiras acenando. Subiu-me um calafrio pelas costas, a saia voava lentamente com o sopro da brisa. E eis que escuto uma voz dizer:

- Eran dos niños muy pequeños que se quedavan acá todas las tardes. A veces un poco más temprano. Y los niños jugaban pelota...

- ?Todas las tardes? - perguntei.

Mas, nada me foi respondido. Olhei para o piso:

Lindos azulejos em tons azuis, envelhecidos. Em vários pontos quebrados, riscados, trincados, mas podia-se observar como era o desenho. Era de um matiz ocre dourado perfeito, ornados por flores em arabescos. Nestes o traço era arredondado. Los niños y la pelota. Quantas vezes teriam rido e brincado ali? Como se foram dali? Qual teria sido o fim deles? Como se chamavam? Qual a cor da bola? Que roupas? Qual tecido era usado nas suas roupas? Andavam descalços pelas ruas ensolaradas ou a mãe os fazia usar os sapatos envernizados de domingo? Como eram seus olhos? Ainda estariam vivos como aquela construção, onde eu me achava?

Nunca saberei. Apenas criei inúmeras conjecturas para os meninos.

Cuba! Um dia retornarei...

Ivna Alba

Escrever um drama

Engana-se piamente quem crê ser tarefa fácil escrever um drama.
Comédia sim, é mais simples, porque o senso de humor é atiçado, em grande parte, quando se expõe alguma situação ou pessoa ao cúmulo, ou se leva satírico, escárnio, ridículo ou absurdo um desses fatores.
Outro ponto: a ironia não nos põe a refletir, a cogitar hipóteses, nem nos provocará um sentimento de querer corrigir o que aconteceu. O drama e o trágico sim, nos comportam essas emoções e sentimentos. Vamos muito além das lágrimas nessas categorias. É algo que induz ao homem ser humano, em toda sua completude.
E, quando falo de drama, por favor, não estou citando - porque estas histórias não entram em meu conceito de categoria dramática - filminhos de cachorros lindinhos e de olhos tristes, que passam durante à tarde nas emissoras brasileiras.
Falo de uma densidade que existe em Senhores e Servos e Onde Deus está, o amor está também - Tolstói. Cito também a profundidade dos personagens de Beckett em, O fim, O expulso e, sobretudo no estupendo O calmante.
Se se fosse designar drama pela quantidade de lágrimas que se derrama, diría-se que a vida é o drama. Contudo, ele vai muito além.
Não se trata apenas de escolher um lugar, quando se passa a estória e selecionar meia dúzia de personagens.
Reflita comigo, caro leitor!
Qual o último livro, filme ou peça dramáticos que você viu?
E, por obséquio, um de qualidade!
A história impregnou, não foi?
É possível que depois dessa história ter passado em sua vida, você reflita sempre que se recordar dela. Cada palavrinha, imagem e cenário ficarão fixos naquela estrutura inteira e lhe fará mexer os nervinhos, de tal forma, que a vida continuará, mas aqueles momentos estarão, por todo o sempre, na caixinha de lembranças.
O drama ainda é uma categoria misteriosa a ser solucionada pelos sentimentos humanos.

Ivna Alba

segunda-feira, 16 de março de 2009

O centro do mundo

Na pequena cidade de Tuiutarama vivia uma menina extremamente pequena, gorda, de cabelos castanhos e danificados pela genética. Não era feia de rosto, mas se achava hedionda. Depois de receber uma pedra no centro do crânio e levar vários insultos, para casa, por sua aparência; bem como se entupir de revistas femininas idiotas, o cérebro da criatura pipocou.
No que sua cuca fundiu iniciou uma guerra incessante entre o corpo e a geladeira.
No início negava a feijoada, a coca-cola, os docinhos, depois passou a negar o arroz. Logo ele, coitado, aquele acompanhante branco e com gosto indefinido. Então, justo o arroz!
Depois foram as batatas, cenouras e o coentro.
Ela começou a viver de 1/4 de uva.
- Uva, porque é comida de rainha!
Ela era a rainha?
- Rainhas têm cabelos bons, sua estúpida!
Gritava a peste da irmã de quarenta anos, que passava o dia inteiro na cadeira de balanço, comendo pipoca e coçando a enorme barriga, enquanto assistia Tv.
O cabelo foi para o formol.
- É, minha filha, nesse seu cabelo, a progressiva tem que ter 80% de formol.
Argumentou a senhora do salão.
Depois do cabelo, que não ficou lá essas coisas, ela depilou todo o corpo. Só não tinha coragem de depilar as sobrancelhas.
Agora era a própria visão da Matita Pereira: velha, magra, cabelos escorridos e grudados no rosto, sem nenhuma gota de vida no semblante e na alma. Sim, ela também começou a falar sozinha pelos cantos e corredores escuros.
- Mas, como elas conseguem ficar assim?
- Por que elas têm dinheiro, sua infeliz!
Gritava a irmã endiabrada.
Numa bela tarde de verão, encolhida no beliche, um objeto de metal brilhou dentro de uma das gavetas do criado.
- Uma pinça!
Imediatamente ela tomou o instrumento e começou a tirar os fios tortos da sobrancelha. Só alguns, de início. E não dormia mais, começou a observar o crescimento dos fios da sobrancelha.
Tuiutarama cresceu, entrou para o mapa do país e os fios teimavam em resplandecer no rosto cheio de rugas.
- Aqui tem, aqui não tem, aqui tem, aqui não tem...
Quando não tinha mais pêlo, ela beslicava a pele e repetia a meia voz o seu mantra.

Ivna Alba

Música

A intenção desse texto não é ser grande, nem pequeno, contudo é mais um ponto de vista da senhorita Alba, que um argumento, para você, leitor, que pode ser um antimusical, terminar seus dias gostando de música. Conversando com um amigo, certa vez, ele comentou que achava fantástico ler um texto do Kafka, que agora fugiu-me o nome da memória, e aquelas palavras fluírem, cada vez, de uma forma diferente.

Meu caro, isso é o que acontece comigo, ao deixar semitons e tons penetrarem em minh'alma. Bachianas Brasileiras No.3 - 3. Ária (Modinha) Largo: Esse é o nome da música que me fascina no momento. E quem disse que o Brasil só tem futebol, carnaval e mulher bunda? Ele tem muito mais que isso. Pesquise, descubra, vamos lá! Fuce aqueles vinis de papai e mamãe e descubra uma porção de melodias e harmonias que penetrarão em seu âmago e o farão se arremessar no muro dos catatônicos. A música terá esse poder arrebatador de lhe fazer saudoso, ou apático, feliz ou com a maior energia de todas, vibrando em suas veias e deixando seu coração lépido e faceiro. As vezes, aquela dissonância que você não esperava fez seus olhos transbordarem, rapidamente e aquela semínima lhe fez bater na caixinha, libertando o samba.

E por falar em samba, lá vem a nossa querida, idolatrada, salve e salve Bossa Nova! Uma mistura que ninguém jamais poderia imaginar que daria certo. Certo, até demais! Jazz e samba, final de 50, um grupo se junta e dão vazão: Chega de saudade, Desafinado, Derradeira primavera, Modinha... E parece que é nesse cantinho e naquele violão que se resume uma felicidade esplêndida desses músicos. E que felicidade é essa? O poder e o fascínio que a música, tida como a mais pura das Artes, desperta no homem. E voltando à Bachiana do Villa-Lobos. A primeira vez que você ouvir feche os olhos e se lembre: isso é da minha terra, onde cantam os sabiás (se estiver lendo isso fora do Brasil, pense "vou voltar, sei que ainda vou voltar").
Como pode rabiscos incognoscíveis, bolinhas pretas e brancas, pontinhos e tracinhos repercutirem em lágrimas ou sorrisos? Esse é o mistério mais absoluto e fascinante que o homem pode ter gerado. É desse homem que eu me orgulho, me curvo e faço questão de que haja o eterno retorno!

Ivna Alba

Nem tudo é óbvio...

Em minhas andanças pelo mundo internético descobri um lugar fantástico para aportar meu barquinho, vez em quando.
Vez que me sentir sufocada demais,
Cansada aos trópicos, ou simplesmente livre para navegar, precisamente!
Espero que gostem, como eu:

http://blog.uncovering.org/

Ivna Alba

quinta-feira, 12 de março de 2009

Sur le fil


Algumas coisas acontecem.

Mas, outras ocorrem vagarosamente, sobre um fio de tempo longo e preciosamente esculpido de horas intermináveis. Essas, sem sombra de dúvida, são as piores. Em geral, são aquelas que passam despercebidas aos olhos.

Fora o último dos nove filhos do homem de bigode farto, que morara na casa vermelha de esquina com a avenida principal. Bairro quase tranquilo, vida meio pacata, crianças na varanda, no jardim, nas telhas quebradiças. Pé engessado.

Começou a vida normalmente, estudou regularmente, sem precisar ser um aluno brilhante, recebeu carinho, amor de quase todos os lados, trabalhou em pequenos ofícios para juntar dinheiro e comprar uma caixa de ferramentas nova, para o pai.

No semblante fechado, os olhos permaneceram estáticos com o presente. O bigode não tremelicou com a gargalhada costumeira, ao se satisfazer com algo estupendo. Nada! Apenas a inércia nos gestos e na face taciturna do pai.

- Venha, Alceu! Seu pai vai falar com o vovô, agora.

Dez anos. Os olhos de soslaio miraram a mão do pai pegar o telefone e os ouvidos assimilaram vagarosamente a risada forte do homem.

- Papai!

Os anos correram iguais: casa, escola, brincadeiras, natal, ano novo, ano velho, ano novo, casa, trabalho, amigos, namoradas, casa, trabalho, noiva, casa, trabalho, esposa, casa, trabalho, esposa, filhos, casa, trabalho, esposa, filhos, contas, casa, trabalho, esposa, filhos, contas, derradeira primavera.

Ano de 1977.

O corredor era longo demais, escuro e frio o bastante para que suas passadas fossem tão firmes e corajosas o suficiente para ultrapassar toda aquela barreira de medo, ressentimentos e sensibilidade. Os burburinhos na sala, os sussurros na sala, as empregadas, os enfermeiros, mamãe.

- A tosse dele...

- Mas, a tosse dele...

- E a tosse dele...

A tosse! Ela transpassava voraz o corredor e chegava aos ouvidos de Alceu, novamente. De soslaio, o corredor escuro, as paredes úmidas, a luz do quarto abrindo, a meia luz, a porta de mogno envernizado. O instante impossível.

- Amanhã de manhã eu volto, mamãe.

- Mas, Alceu...

- Amanhã de manhã... Antes do trabalho.

Pela manhã, sobre a linha tênue, o ritmo do ciclo orgânico e a morte retumbaram, culminando não em um simples fenecer, mas no sim à terra, na fidelidade à terra. O coração bombeu, tombou, caiu, prostrou-se em milhões de sofrimento. O bigode farto no rosto magro e senil. A boca se escondia pela camada grossa de pêlos, tiraram-lhe os óculos, vestiram-lhe o terno que comprara em abril, sapatos engraxados, inúmeros cravos brancos e aquele cheiro intragável de cravos, em meio à presença da ceifadora, o gosto das lágrimas tardias de Alceu, o abraço ao corpo quente da mãe, os lenços com cheiro de macadâmia, o sabor da hortelã de domingo, a mão pesada do pai nos ombros dele, ensinando-o a bater um prego com o martelo, aquele bolo de laços que não conseguia desatar na garganta, a fagulha de tempo finda, finita e posta.

A tosse ecoava nos pensamentos de Alceu.

Balbuciou algo, perdido nos escombros da infância, que só conseguiu dizer-lhe pelo olhar de soslaio, mas que não fora visto. O eco sobre o fio. O eco sobre a terra. O eco sobre o mármore. O eco na expansão do arrependimento. O eco carcomendo a mágoa e o desespero. Nada mais depois disso.

O eco!


Ivna Alba

domingo, 8 de março de 2009

Efêmero, insuportável efêmero...

Estava meu pensamento circulando por muitas zonas livres este dia, quando repentinamente surgiu-me uma súbita idéia agoniante: mais um ciclo está se fechando para mim. E, creio que não só para mim, mas para muitas outras pessoas que conheço.
Pouca idade, mas uma certeza: o tempo está me tragando, me consumindo cada segundo mais e cada dia me engolindo com mais e mais voracidade. "Mais"! Esta é a palavra que se tornou muito comum.
Hoje todos querem "mais": mais conforto, mais vida, mais saúde, mais dinheiro, mais comida, mais roupa, mais emprego, mais casa, mais carro, mais velocidade, mais amigos, mais família, mais amor, e no final a única coisa que se tem é "menos". E o principal: temos muito, mas muito "menos" tempo.
Esta semana não passou apenas trotando, nem galopando, ela passou voando, literalmente voando a zilhões de quilômetros por hora. E nem bem amanhecia outro dia, a sexta já dava o sorriso mais terno, para quem esperava a hora de chegar ao bar e se deliciar com a primeira cerveja do final de semana.
Simplesmente aconteceu de mais uma semana chegar, o mês de março entrar e não tivemos tempo ainda de cogitar o que aconteceu.
- O tempo passou!
Sim, simplesmente o tempo passou...
A questão é justamente essa: menos e mais. Quando realmente estaremos prontos para encarar a efemeridade que tão logo nos furta mais um sopro de vida ou descanso? Por estes dias receberei meu diploma e a primeira pergunta que me faço, antes de mais ninguém é:
- E agora, Ivna Alba?
Junto comigo, milhões de jornalistas recém-formados serão despejados no mercado de trabalho, e a grande maioria não será absorvida. Queremos "mais" empregos? "Entretanto, não é possível!" - me diz o porta-voz do governo, no jornal da noite. E nos submetemos ao primeiro subemprego que nos aparecer, com a gana de tentar sobreviver neste mundo de bocas, neste universo carnívoro de tempo, onde as frustrações são muitas e os que conseguem mais tempo, não sabem o que fazer com ele, porque possuem tudo demais, se esquecendo que o mundo é o de menos, com o que se preocupar.
Pois é, costumam me dizer que sou muito jovem para me preocupar com certas coisas, contudo se eu não me preocupar agora, serei mais uma senhora que não viu o tempo passar, que não cuidou o quanto antes e no final da comédia, não saberá como fechar a cortina.
Gostaria de poder vivenciar melhor meus bastidores, por falar nisso. Porém, nem para isso tenho mais tempo, nem dinheiro e nem emprego.
O meu maior medo, nesses últimos tempos, é me tornar uma pessoa frustrada. Não, meu medo nunca foi o da morte. Esta é apenas uma consequência de meu corpo possuir vida, uma banalidade cruel para quem fica, um alento a "mais" para quem vai; a única certeza que posso ter nos meus dias, e não me entristeço ou me inquieto por esta segurança, ao contrário sou feliz por, também, não possuir "mais" esta dúvida.
Quando, realmente, é que poderemos nos preocupar com a vida, senhores e senhoras experientes? Não foram vocês, também um dia, que quiseram se preocupar com o futuro, e lhes disseram que a idade era ínfima para tal agonia? Eu prefiro, desde já, pensar no futuro e saber que o efêmero, o insuportável efêmero, também golpeia e fere os mais jovens.

Ivna Alba

terça-feira, 3 de março de 2009

Le moment Hardy

Mer
mon cœur pèse des tonnes
et mon corps s'abondonne
si léger à la mer
la mer pleure ses vagues
qui ont un goût de larmes
et s'en vont, éphémères,
se perdre en la terre
se fondre à la terre
Mer
magique, originelle
dans son rhythme essentiel
le ventre de la mer
vous garde pour vous jeter
dans un monde desséché
qui n'est fait que de terre
où je n'ai jamais
su ce qu'il faut faire
et la vague danse et joue
puis se brise
et la mer tout à coup
devient grise
mon amour est si lourd à porter
je voudrais doucement me coucher
dans la mer
magique, originelle
dans son rhythme essentiel
je voudrais que la mer
me reprenne pour renaître
ailleurs que dans ma tête
ailleurs que sur la terre
où sans mon amour
je ne peux rien faire

Para os que apreciam a Françoise Hardy - Mer. Bela música: arranjo, harmonia, letra e voz. Tudo é perfeito nesta música!

Ivna Alba

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Modigliani

"Quando descobrir tua alma, pintarei teus olhos!"
Não é necessário falar sobre esta pintura (Retrato de Jeanne Hébuterne (1898 -1920), Common-Law Wife of Amedeo Modigliani. 1918. Oil on canvas. 92 x 60 cm. Private collection), a obra por si só já debate e dialoga com o espectador, que assiste seu fulgor e esplêndida concepção.
Amedeo Modigliani, italiano e judeu. Viveu intensamente seus 36 anos, nas artes, bebidas e drogas (ópio). Para a época, traços difíceis de se compreender, de gênio rebelde e orgulhoso, não se submetia às pinturas encomendadas e se dedicou durante muito tempo há escultura, também.
A sua série de nus se iniciaram por volta de 1914 e tempo depois, ao expôr em galeria, teve que ser retirada por "afetar a moral".
Teve uma filha com Jeanne Hébuterne - esposa e amante - a quem pintou inúmeras telas.
O filme, Modigliani, dirigido por Mick Davis - 2004 - possui bela fotografia, para quem gosta de diálogos o filme os tem, para quem gosta de uma perspectiva mais silenciosa para se observar, a película também possui, entretanto, para mim faltou uma consistência maior em como o artista desenvolvia seus traços.
Enfim, é uma boa pedida para se assistir embaixo do edredon, uma garrafa de "cabernet", no friozinho... A companhia fica por conta de cada um, não é mesmo?
Melhor do que isso, só lendo a vida e estudando a obra deste pintor magnífico!

Ivna Alba

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Esquivo


Ele tinha olhos furtivos! Lindos, porém furtivos. Nada que o calor da tarde não os fizesse mais estagnados e taciturnos. Quase um compasso de balada, suas piscadelas se tornaram. E nem bem anoitecia, corriam pelas calçadas e metálicas avenidas. Voltavam, à vida, aqueles olhos.
- Não há necessidade de se manter estático. Rotativa! Rotativa! Rotativa! Rotativa!
Gritava e saía em disparada, atravessando carros e multidões. Quem se atreveria a segurá-lo? Pelo braço? Nunca! Pelas mãos? Jamais! Absolutamente pelos olhos: apertadinhos, de cor negra e fugidia; impossível ver sua pupila em tão absorto ébano.
- Destrua aquelas flores que te dei, Carla!
- Por quê?
- Por que não eram para ti!
- E para quem, então?
A gargalhada frouxa em meio ao rush, completamente insano e desvairado.
- Dá tua mão!
- Não!
- Só para atravessar esse trecho da rua... Movimentada.
- Vou para o outro lado.
- Mas...
- A primavera acabou!
Seguiu o leste, entrou no primeiro bar que achou, sem olhar para trás, e a rua se fez imensa, gigante, avassaladora, catastrófica, uma terrível quimera que a engoliu, tragou, mastigou, triturou e jogou, por entre os dentes, a chave que levava sempre consigo.
Olhos furtivos e negros boiando na límpida e tranquila aparência do líquido, no copo.

Ivna Alba

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

A menina que comprava livros...


I PARTE


Aos dois anos, ao ir com o pai à livraria, balbuciou:
- Ubiladeilo abalelo!
O pai, surpreso com aquele novo dialeto, olhou para um livro, para onde ela apontara.
- Ah! Lindo, não filha?!?
- Ubiladeilo abalelo!
Uma capa azul, com um quadrado branco ao centro, e um desenho terrível de um brigadeiro amarelo, contariam a fantástica saga de um brigadeiro, que junto a beijinhos e tortilhas, tocariam o terror, em uma festa infantil. Tudo porque não queriam ser digeridos e jogados dentro do sanitário, que logo desembocaria no oceano mais perto.
O pai, puxou a filha, carinhosamente, para a prateleira de Goya, Caravaggio, Rembrandt, Manet, Turner, Modigliani, Gauguin e sacou da mais alta um volume grosso de Portinari. Sentou-se à pequena mesa e começou a folhear a obra. Sorrateiramente sua filha se desprende daquelas pinturas e corre à seção infantil e volta, falando em um tom sério:
- Ubiladeilo abalelo! Ubiladeilo abalelo! Ubiladeilo abalelo! Ubiladeilo abalelo!
Neste exato momento, o pai se conscientizou da importância daquele brigadeiro amarelo, para a menina e decidiu levar, se divertindo horrores depois com a estória daquele alimento arruaceiro, mas ao mesmo tempo, muito consciente de sua existência e de como era bom viver, mesmo que fosse para ser um brigadeiro.
Do doce, a pequena passou para as estórias do Lobato, Quintana, entortou para o Rodrigues, Stendhal, correu aos braços da Mulher de Trinta Anos, alçou voo com o minuano em O tempo e o vento, arrepiou-se com a descrição infernal de Dante, detalhou a obra de Câmara, sucumbiu aos lamentos de autores não conhecidos, e quando observou estava farta de livros.
O dono da livraria a moça como a melhor cliente, em 30 anos de negócio.
- Trabalhar com cultura não é fácil, né minha querida? Você sabe do que estou falando, não é mesmo, minha querida?
Aquele tom de "minha querida" lhe soava falso.
- Queria saber se, em alguma semana do mês, eu não pusesse meus pés aqui. Ele colocaria imediatamente o "minha querida" em um baú de couro, todo carcomido de cupins e outros insetos medonhos, onde deve guardar todos os "meus queridos e minhas queridas" de clientes que não puderam comprar seus livros, em um fatídico dia de setembro. Ou por que o trânsito estivesse um caos completo, ou por que o dinheiro não desse para o mais novo volume do Roth.
E assim, ela ia divagando por todo o trajeto - caixa, casa - deitava na cama fofa, de almofadas brancas, com bordados de tulipas vermelhas e revirava o mundo daquelas letras, abaixo.



Ivna Alba

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Dueto de separação

Ela parou e não lhe disse palavras. Abriu a porta do quarto como se o aguardasse falar “Espera”, mas não houve nenhum sussurro proferido pela voz dele. Apenas um vazio seguindo-a, enquanto andava com a mala pronta e o vinco de preocupação na testa. Era posta uma chama que ela acreditava nunca ser extinta. Ouvia os passos dele lentos a seguir os seus e o silêncio que se interpusera naquele pequeno espaço físico.



Ivna Alba

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Fragmentos, repartições e partituras

Talvez não sintas falta agora, mas um dia terás muitas.
***
Espera mais um pouco, resta um bocadinho de tempo para dizeres, ou não, o que pode significar uma eternidade em tua vida.
***
-Calhorda!
O grito se fez a plenos pulmões dentro dela, escapando todo o ódio ruminado durante dias.
-Calhorda!
E repetia em um tempo mudo de todas as desgraças e flagelos.
-Calhorda!
Choramingou a alma, derretendo em uma tristeza profundamente.
-Por que o mundo só gira em voltas contrárias e não, nas que deveriam acontecer?
***
Abriu a caixinha de surpresas. Lá estavam as cartas, os mimos e as fitas. Recolheu-os e revisou todos, um a um, tentando desvendar como se fizeram e desfizeram dentro de tanto tempo. Não houve respostas. Ao contrário, cada vez que desatava um nó, as horas se tornavam mais densas e incontáveis. O que desejava? Ah, ela desejava tanta coisa...

Ivna Alba

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Ela, ela mesma e o vazio






-Psiiiiuuuuu! Não conta ainda, não!

-Por que, não?

-Por que não, oras!

-Mas, tá difícil esconder! Não dá mais, não dá mais, não!

-Pare de se atormentar, porque tudo tem a hora certa de ser e de caminhar!

-Mas, dizem a boca pequena que cada um faz a sua hora.

-Isso é verdade.

-Então?

-Então, aguarda, criatura!
-Quanto tempo mais?

-Não sei... não sei mesmo...

-Vida bandida, destruidora de nervos, esperas mais que necessárias, isso tudo mexe demais comigo e o pior que só o nada anda lá fora.

-O nada, não, mas o desejo de que logo chegue o próximo amanhã.

-"E poder assistir ao entardecer e saber que vai ver o sol raiar".

Se diluiu a cena, ao longe, durante o longo caminho, o bar de portas abertas e uma luz amarelada preenchidas pela estrofe repetida e a espera de mais outro diálogo sobre o tempo, as horas, o som e os amores, sendo estes perdidos ou não...


Ivna Alba

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

O que eu fiz com a minha vida!


Amigos são maravilhosos, principalmente quando nos proporcionam encarar a realidade nua e crua. Dedicação da Tirinha: Xaxá para Ivna.


Ivna Alba

Promessas de Ano Novo

A TERRA PROMETIDA

Toquinho e Vinícius de Moraes

Poder dormir.
Poder morar.
Poder sair.
Poder chegar.
Poder viver
Bem devagar
E depois de partir
Poder voltar.
E dizer: este aqui É o meu lugar.
E poder assistir
Ao entardecer.
E saber que vai ver
O sol raiar.
E ter amor
E dar amor.
E receber amor
Até não poder mais.
E sem querer
Nenhum poder,
Poder viver feliz
Pra se morrer em paz.

E quem não faz um plano assim? A meta do momento é ser feliz, completa, inteira e totalmente feliz. Sem se importar com o que vem amanhã ou que já passou ontem. O lema é viver!
Viver sem vergonha, amar sem ter porquê, apenas pelo fato de sentir o peito preenchido de um bom sentimento, de uma emoção, mesmo que frustrada, mas que provará que há vida neste corpo.


Saravá, Vinícius!
Saravá, Tom!
Saravá, Toquinho!
Saravá, Cartola!
Saravá, Badinho!
Saravá, vida minha e de tantos!


Feliz Ano Novo 2009, para todos nós!


Ivna Alba