domingo, 5 de abril de 2009

O Triunfo da morte


A humanidade lançada às redes do destino inexorável. O temor que se apodera dos homens desde que foi implantada a consciência cristã, no mundo. A sensação de culpa, pecado, vergonha, piedade, misericórdia e clemência.
É disso que em uma breve leitura se faz, imediatamente, do quadro de Pieter Bruegel, O triunfo da morte.
Don DeLillo, em 1936, já faria seus comentários sobre a obra, datada de 1562, e que se encontra em Madrid, no Museo del Prado.
A tela, muitos antes de ser uma esplendorosa arte, amparada pelo Feio e Grotesco, denota uma espécie de Dança Macabra entre a vida e o confronto final com o derradeiro suspiro. É a luta, a batalha que cada um deve travar por todos os segundos em que sente seu inspirar e expirar.
Da forma como se observa, pode se destacar o temor e o terror das massas pecadoras, diante a iminência do transpasse, que certamente não era bem acolhido na época. Talvez ele nunca o seja.
É remetida constantemente a idéia de destruição, em todas as partes, inclusive no canibalismo do cão esquelético trucidando calmamente um recém-nascido, ainda nos braços da mãe que já sucumbiu à ceifadora. Se ele está com vida, ou não, quiçá não seja de grande importância, mas sim o fato que neste detalhe pode-se achar o início e o fim da idéia de Bruegel, ao denotar nesta cena o encontro de símbolos que evidenciam uma presença do futuro e o outro como prisma fundamental do quadro: o triunfo, a vitória da morte. O carnívoro como o triturador do futuro. A máquina que usurpa a esperança. Enquanto o destino e pretérito se encontram, os personagens que ainda possuem algum sopro de existência batalham pelo desejo que ainda lhes resta de viver, em meio ao cenário perturbador e desolador que penetra no âmago do contemplador. O firmamento incendiado, as cruzes que esmagam os combalidos e semi-vivos, os esqueletos que imperam perante uma terra áspera e seca.
É um cenário dantesco, muito embora não remeta ao inferno, nem purgatório, mas sim ao pensamento inicial e hediondo que o cristianismo conseguiu alastrar.
Os pecados mortais e capitais! Todos eles pisoteados e corroídos por esqueletos vivos. Alguns poderiam dizer que este tipo de arte não seria legítima por se utilizar do Feio e, assim mascará-lo com a Beleza e a grandiosidade da arte, produzindo a inverossimilhança, mas é nesta que reside o esplendor da arte. É emergir com outras categorias estéticas a valia maior do artista e pôr no que vê a crítica do que seria soberbo, para ele.
Outro ponto é inegável na obra, no tocante à natureza, que inegavelmente se mostra avassaladora, para com os homens. Toda ela se apresenta voltada ao fim.
E concomitante ao que o cristianismo tenta fazer com os homens, levando-os a temer a morte, Bruegel nos põe algumas dúvidas: se há lutadores é por que o fim não é iminente? Se existe uma lança transpassando o nosso terminal inevitável, é por que este não necessariamente é implacável?
O triunfo da morte, muito antes de ser uma marca impregnada de culpas, pecados, pessimismos cristãos, eternidade, é sim um início de que o final é e deve ser escrito por cada um da forma que deseja, seja na luta pela vida e pela esperança, seja na consciência de que o valor de uma vida não deve sucumbir por completo aos sentimentos cristãos de pessimismo, e a idéia de que a eternidade compensa o sofrimento e a angústia que a humanidade sente, mas sim de que é na vontade e no instinto humano que a vida e a história se sobrepõem, vencem e triunfam.
Se a morte é a nossa última estação, que a alcancemos, mas da maneira mais consciente e humana possível.
Nietzsche estava correto ao dizer: “A vida foi isso? direi à morte: Então mais uma vez!”.

Ivna Alba

2 comentários:

Moacir Moreira disse...

Tá com o diabo no corpo, minina???

Vixe!

Sil disse...

Muito bom, Vivi.. Gostei.
Detalhe: depois de um mes de atraso eu vim lhe visitar.
Bjao