quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Carlota Bareghia IV

Existia um encantamento naqueles olhos grandes redondos e castanhos. Duas contas imensas de pureza sondavam os pés da mãe, do pai, dos tios e tias, enervavam as rugas ordenadas dos tornozelos dos avós e com suas mãozinhas repetia os movimentos de pulinhos com a boneca de pano.
Na turbulência da reunião familiar, ninguém parou para falar com a criança que olhava para tudo e já sentia plantada em sua realidade as perguntas:
- Quem sou? De onde venho? Para onde vou?
Carlotinha, ou melhor, Titinha não entendia o homem, e dali a pouco não entenderia o mundo.
- Uma mescla de bagunça dos diabos!
Gritava e socava as poucas mudas de roupas dentro da mala. "Aos malditos que moram nesta casa de misérias, uma vida de muitas calúnias".
Batera o portão da quarta pensão, onde se enfiara aos dezesseis anos, e já estava amarga demais para chorar por falsos e medíocres.
- Aos diabos, corja dos infernos!

Ivna Alba

Um comentário:

Raul Drewnick disse...

Aos diabos, corja dos infernos. Um bom lema. Fernando Pessoa termina um soneto de amor com uma frase semelhante: "Raios partam a vida e quem lá ande!"