quinta-feira, 3 de julho de 2008

Amargo

E existia um cheiro ali, de tudo que era podre e azedo, não necessariamente desapropriado para o consumo, porém imprudente se ingerir.

"Adalberto"!

A voz da mãe o chamava do limbo, onde se havia perdido, diante de tudo que se havia tornado a vida dos dois. Não que não se dignasse, ou não quisesse ouvi-la, mas que eram naquelas horas e dias, meses e anos de solidão que ele reparava como se precisava de paz; e paz era algo inimaginável, tanto pela presença materna, quanto pelo que era dito pela boca dela, pelas palavras proferidas por ela, pelos sons guturais emitidos pela garganta dela. Quando se sai do inferno é que se tem a certeza da existência de um paraíso.
Pensando na solidão: foi assim que Adalberto dormiu sua última noite naquele quarto, cuja verossimilhança de quarto inexistia, todavia ele sabia que era daquela forma que o via e sentia, por mais fedor e nojo que tinha de tudo aquilo ali. Quadrado de luz lunar formada pelas grades da janela milimetricamente calculada, retorcida de barras grossas e imundas de ferro fundido e chapado. Pela pouca iluminação de uma possível pia, de um colchão cheio de pulgas e cortejos de dejetos e baratas rodopiando seus sonhos ou pesadelos.
A estrita maneira de se tornar afável nos momentos de não embrigaguez da loucura, uma torrente de cenas que não lhe aconteceram, contudo o fizeram crer ocorrido, uma porção de gemidos fragmentados e riachos agridoces de sangue empoçado e empapado na camisa e no assoalho de madeira, que nunca vira.

"Amanhã, Adalberto, será teu desfecho, na ponta daquela agulha, e tu invarialmente não podes dizer que sim, nem que não, porque doce o mundo não é, e amargo vai ser teu final.

Ivna Alba

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